Antes
de abordar a questão jurídica em tela, é oportuno registrar que o “caput” do
artigo 132 da Constituição Federal elenca como uma das funções institucionais
da Procuradoria-Geral do Estado (PGE) a consultoria jurídica. No exercício
dessa função institucional, o Procurador do Estado, no bojo de processo administrativo,
exara parecer estritamente jurídico, com vistas notadamente à redução da
litigiosidade estatal ineficiente e antieconômica.
Dessa
forma, a PGE resguarda o interesse público secundário, isto é, o interesse
patrimonial do Estado. Isso porque parecer jurídico pautado nas normas
jurídicas (princípios e regras, conforme o princípio da juridicidade,
positivado no art. 2º, p.u., a, da Lei Federal nº 9.784 c/c Súmula nº 633 do
Superior Tribunal de Justiça - STJ), à luz das diversas fontes do Direito (lei,
jurisprudência, doutrina, costumes, precedentes administrativos e praxes
administrativas, ressalvadas as divergências doutrinárias acerca das fontes do
Direito), que conclua favoravelmente ao direito pleiteado pela via
administrativa e que seja utilizado como fundamento pelo gestor público para o
deferimento evita processo judicial em que o Estado muito provavelmente
restaria vencido, processo esse que geraria maiores dispêndios públicos.
Nessa
linha, quando são encaminhados à PGE autos administrativos sobre pagamento
indevido a título de remuneração, proventos de aposentadoria ou pensão por
morte, o Procurador do Estado emite parecer jurídico em que analisa as
peculiaridades do caso concreto e conclui se é ou não devida a devolução à
Administração Pública.
A
propósito, o princípio da vedação do enriquecimento sem causa (arts. 884 e ss.,
do Código Civil/02) fundamenta a devolução aos cofres públicos de montante
indevidamente pago. Todavia, deve ser sopesado com os princípios jurídicos da
boa-fé objetiva e da confiança legítima (acepção subjetiva do princípio da
segurança jurídica).
Assim,
em consonância com a Tese fixada pelo STJ quanto ao Tema Repetitivo nº 531
(“Leading case”: REsp 1.244.182/PB), a Súmula nº 249 do Tribunal de Contas da
União e a Súmula nº 34 da Advocacia-Geral da União, com base nos princípios
jurídicos da boa-fé objetiva e da confiança legítima/ segurança jurídica,
considerando, ainda, a presunção de legalidade, legitimidade e veracidade da
atuação administrativa e o caráter alimentar dos valores pagos, no caso de
pagamento indevido resultante de interpretação errônea ou equivocada de lei por
parte da Administração Pública, a boa-fé do servidor público/beneficiário
previdenciário é presumida, não sendo, então, devida a devolução ao Erário.
Enquanto
que, no caso de pagamento indevido por erro administrativo (material ou
operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
Administração Pública, a boa-fé do servidor público/beneficiário previdenciário
não é presumida. Por isso, nesse caso, em regra, é devida a devolução ao
Erário, salvo comprovação da boa-fé objetiva do servidor público/beneficiário
previdenciário, especialmente com demonstração de que não lhe era possível
constatar o pagamento indevido. Isso em consonância com as Teses fixadas pelo
STJ quanto ao Tema Repetitivo nº 979 (“Leading case”: REsp 1.381.734/RN) e ao
Tema Repetitivo nº 1009 (“Leading cases”: REsp 1.769.306/AL e REsp
1.769.209/AL).
Observados
os princípios jurídicos do devido processo legal, do contraditório e da ampla
defesa (art. 5º, LIV e LV, da CRFB), o Procurador do Estado, então, mediante
parecer jurídico, procede à subsunção dos fatos às normas, à luz do exposto,
para concluir se, no caso em análise, é ou não devida a devolução à Administração
Pública.
Gabriela dos Santos Barros
Procuradora do Estado do Tocantins associada à Aproeto.
Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Piauí. Pós-graduada em Direito
Administrativo pela Universidade Candido Mendes. Mestranda em Prestação
Jurisdicional e Direitos Humanos pela Universidade Federal do Tocantins em
parceria com a Escola Superior da Magistratura Tocantinense. Coautora de livros
e autora de artigos científicos.